Magali Silvana Ortolan – Psicóloga Clínica
Roberta Ortolan – Professora de Ensino Infantil
O pensamento registrado em palavras resguarda todo o conhecimento que nossa espécie adquiriu. Foi por meio do registro gráfico que as descobertas puderam ser passadas adiante para as novas gerações, acumulando informações para serem ampliadas e revistas. Diferentes modos de ver o mundo também foram registrados, assim como as ideias dos grandes pensadores que tentaram explicar o homem na sua imensa complexidade. Pedras, placas de argila, papiros, pele de animais… Diversos suportes abrigaram esses registros até que o papel, invenção milenar, se mostrasse um suporte mais qualificado e que perdura até hoje. As dimensões e a flexibilidade das folhas de papel permitiram que os livros fossem criados.
Livro… Objeto em que cabe o mundo! Um mundo de ideias, de fantasias, de histórias reais, de histórias imaginadas que poderiam ser as nossas… Cabe filosofia, geografia, matemática, física, química e geometria. Cabem os planetas, cabem as estrelas, cabem crenças e desconfianças…
E na psicologia? Cabem as Obras Completas de Freud com os conceitos de id, ego e superego, o mundo do inconsciente, das neuroses, da descrição de casos tão bem elaborados, cabe a arte da cura pela fala. Cabe Jung com O Homem e seus Símbolos.
Cabe a psicologia comportamental com Pavlov e Skiner.
Na psicologia humanista, cabe Maslow com a hierarquia das necessidades e Motivação e Personalidade. Tornar-se Pessoas, Um Jeito de Ser e Em Busca de Vida, de Carl Rogers, com os conceitos de tendência atualizante, não diretividade, congruência e aceitação incondicional. Fritz Perls com Gestalt – Terapia Explicada e a consciência do aqui e agora.
Cabem as digressões de Clarice Lispector, o desencanto com o mundo de Drummond, a intensidade de Leminski, a simplicidade de ser feliz de Manoel de Barros…
Cabem Ilíadas e Odisseias, cabem Lusíadas, cabem as histórias de todos os povos…
Cabem Plínio Marcos e suas subversões, cabe a expressão do feminino de Adélia Prado, cabe a lascívia de Hilda Hilst…
Cabe o humor de Luís Fernando Veríssimo, cabe a ludicidade de José Paulo Paes, a sensibilidade de Elias José, a originalidade de Guimarães Rosa, a delicadeza de Cecília Meireles, a superação de Carolina de Jesus, a coragem de andar na contramão de Road Dahl, a crença em um futuro melhor e na escrita como redenção de Gianni Rodari…
Num livro cabem universos infinitos. Ler nos permite desbravar novas terras, ancorar em novos portos e partir deles, ora reconstruídos, ora destruídos, mas com a possibilidade de nos renovar, de nos reencontrar, de nos refazer.
A escrita, ao final das contas, registra muito mais que os saberes acumulados: registra a experiência humana. Um livro pode ser uma tradução do mundo pela perspectiva do escritor. Também pode ser uma experiência profunda de partilha de si mesmo feita por um autor, a entrega mais plena que se pode fazer. É preciso, no entanto, que o leitor esteja disposto a receber essa dádiva mergulhando e compartilhando dessa vivência.